Desejo - Casimiro de Abreu
Se eu soubesse que no mundo
Existia um coração,
Que só' por mim palpitasse
De amor em terna expansão;
Do peito calara as mágoas,
Bem feliz eu era então!
Se essa mulher fosse linda
Como os anjos lindos são,
Se tivesse quinze anos,
Se fosse rosa em botão,
Se inda brincasse inocente
Descuidosa no gazão;
Se tivesse a tez morena,
Os olhos com expressão,
Negros, negros, que matassem,
Que morressem de paixão,
Impondo sempre tiranos
Um jugo de sedução;
Se as tranças fossem escuras,
Lá castanhas é que não,
E que caíssem formosas
Ao sopro da viração,
Sobre uns ombros torneados,
Em amável confusão;
Se a fronte pura e serena
Brilhasse d'inspiração,
Se o tronco fosse flexível
Como a rama do chorão,
Se tivesse os lábios rubros,
Pé pequeno e linda mão;
Se a voz fosse harmoniosa
Como d'harpa a vibração,
Suave como a da rola
Que geme na solidão,
Apaixonada e sentida
Como do bardo a canção;
E se o peito lhe ondulasse
Em suave ondulação,
Ocultando em brancas vestes
Na mais branda comoção
Tesouros de seios virgens,
Dois pomos de tentação;
E se essa mulher formosa
Que me aparece em visão,
Possuísse uma alma ardente,
Fosse de amor um vulcão;
Por ela tudo daria...
— A vida, o céu, a razão!
Casimiro José Marques de Abreu, ou Casimiro de Abreu, (Barra de São João, Rio de Janeiro 4 de janeiro de 1839 - Nova Friburgo, Rio de Janeiro 18 de outubro de 1860) - Foi um dos poetas mais populares do Romantismo Brasileiro. Colaborou com as revistas O Espelho, Revista Popular, A Marmota e com o Jornal do Correio Mercantil. Foi escolhido por Teixeira de Melo para patrono da cadeira nº 6 da Academia Brasileira de Letras no momento de sua fundação.
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