18/01/2011

Chuva de dores



    Hoje acordei assustada. Sabe quando você está dormindo, mas bem baixinho lá no fundo está de alguma forma ligada com o mundo acordado? Pois, eu dormia, mas lá no fundo ouvia as notícias da TV, até que uma em especial me fez pular da coisa (coisa que é deveras difícil). E no meu susto, fui ouvindo e chorando, me sensibilizando, me sentindo dentro da história, sendo humana e solidária, a dor era tanta que transpassava aquela televisão.
    Felipe foi um dos milhares de moradores das áreas afetadas pelas chuvas que arrasaram a região serrana do Rio de Janeiro na última semana, que perdeu casa, pertences, dignidade e como se não bastasse a dor de perdas materiais, perdeu um bem irrevogável, seu filhinho de 5 anos estava desaparecido, perdeu-se no meio da confusão e desespero durante a enchente. O rapaz então começou uma procura por abrigos, hospitais e órgãos que estão cuidando das crianças sobreviventes que estavam perambulando sozinhas pelas ruas, até que uma parente viu uma reportagem em um abrigo para crianças um menino muito parecido com o Felipinho (o nome do menino, que levava o nome do pai) e todos se encheram de esperanças. 
    Então Felipe procurou a equipe de reportagem de uma emissora para saber que abrigo era aquele, prontamente a equipe se ofereceu para ajudar e incrivelmente eu pude ver que de fato não era sensacionalismo, estavam todos sensibilizados com a história, ainda mais quando Felipe tirou do bolso uma foto do menino, sorridente, feliz, criança.Foram então ao lugar e uma parte da equipe foi procurar a reportagem em seu arquivo. Rodaram a cidade arrasada durante horas, percorreram os abrigos e ginásios lotados de pessoas completamente perdidas e destroçadas, mas nada do menino Felipinho. Até que em um hospital, disseram ter um menininho que correspondia com as descrições do pai e foi quando vi o olhar de esperança naquele homem, era cortante, pois logo encontraram a reportagem e  o pai então deu um grito de desespero "Não é o meu filho, não é ele". E todos, todos choraram. E eu, bem, eu daqui do meu conforto quente, seco, limpo, não segurei minha emoção e fui aos prantos ao chão. Eu nunca tive filhos, eu não sei ainda a dimensão deste amor, mas, senti profundamente a dor daquele pai. Ninguém encontrava o Felipinho e ele não era o menininho da reportagem. E Felipe voltou para casa sem seu filhinho, jurando que continuaria a procurar seu filho.
    O que me deixa ainda mais triste, é que ele estiver morto (o mais provável, infelizmente), seu pai nem consiga encontrar seu corpo e lhe dar um enterro e um túmulo...
Quando eu era pequena minha mãe me dizia que quando morria uma criança no mundo ela virava estrela. Hoje eu quis muito voltar a acreditar nisso, queria mesmo que fosse verdade. Elas merecem, pois são puras. E eu queria muito que o Felipinho fosse uma estrela sorridente brilhando lá no céu.
    Não quero falar de culpados, de dinheiro, de bens. Há bens que são impagáveis, são as vidas...Ceifadas por incompetência e economias ridículas. Só quero falar de solidariedade e sentimentos indispensáveis a nós da comunidade humana.


Ana Paula Duarte.

     Para atualizar a quem interessar (aqueles que não estão tão entretidos com o BBB 11 ou coisas similares), deixarei alguns links com informações e um balanço sobre a tragédia. Depois de informados tirem suas próprias conclusões, mas de pronto aviso, se Políticas Públicas de Prevenção não forem criadas no sentido de mapear as áreas de risco de todo o país e criar uma central de monitoramento, em breve mais catástrofes virão e temo que acabemos por não chorar, nem sofrer, mas, que nos conformemos e que tudo se banalize.










Mas, se o BIG BROTHER BRASIL estiver mais interessante, desconsiderem tais informações.

"Como cidadão, o escritor tem compromisso com seu tempo, seu país, as circunstâncias do mundo. O futuro vai julgar a obra do autor, mas o presente tem o direito de fazer um juízo sobre o autor que ele é." SARAMAGO

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