01/10/2011

Rafinha Bastos, o novo rei da baixaria


Não é fácil ser engraçado. Mais difícil ainda é não sair do trilho ao caminhar por algumas fronteiras tênues desse universo. Para fazer rir, é preciso ir além do que prega o senso comum. Em vários momentos, desafiar a patrulha politicamente correta. Afinal, humor a favor tem tanta graça como dançar com a irmã. Um passo em falso, no entanto, pode tirar o comediante do campo da irreverência e da ousadia e pôr tudo a perder. Quando a piada se sustenta sobre preconceitos ou grosserias gratuitas, o resultado é sempre constrangedor e ofensivo.

+ As frases infelizes de Rafinha Bastos e de outros comediantes

Dentro da nova geração do humor brasileiro, boa parte dela formada por talentos surgidos nos palcos paulistanos ou nos programas de TV produzidos por aqui, muitos parecem não ter aprendido ainda a lição mais básica do seu ofício. Para essa turma, é engraçado fazer troça de autistas, de vítimas do holocausto ou das minorias, para citar apenas alguns exemplos recentes. Nessa lamentável competição da comédia de baixaria, quem vem se destacando é Rafinha Bastos.



O gaúcho de 34 anos faz sucesso em várias frentes. Está entre as estrelas do “CQC”, da Band, atração que registra picos de audiência de 8 pontos no Ibope e chega a ficar em segundo lugar em seu horário nas noites de segunda. No teatro, os shows do rapaz lotam o Comedians, na Rua Augusta, casa da qual é um dos sócios. Na internet, seu Twitter tem cerca de 3 milhões de seguidores e ele chegou a ser apontado pelo jornal americano “The New York Times” como o mais influente do mundo, à frente de nomes como Lady Gaga e Barack Obama. Na publicidade, foi visto em mais de 730 comerciais somente neste ano.

+ Veja algumas das gafes de Rafinha Bastos em vídeo

Como efeito colateral de toda essa popularidade, Rafinha parece que vestiu a carapuça de gênio acima do bem e do mal, achando que tem o direito de fazer e falar qualquer coisa. No último dia 19, superou-se na capacidade de dizer coisas grotescas. Instado a comentar uma cena que exibia a cantora Wanessa Camargo, grávida de cinco meses de seu primeiro filho, engrossou a antologia de barbaridades levadas ao ar com esta inacreditável frase: “C... ela e o bebê”. O comentário não estava no roteiro. Ou seja, o comediante improvisou na hora o “caco”.

No dia seguinte, o site da “Folha de S.Paulo” criticou a postura do humorista. Desdenhando, ele respondeu em seu Twitter, com a mesma impecável elegância: “Olá Folha de SP, vai tomar no olho do teu...”. Na Band, ninguém achou graça da história. “A emissora não gostou da piada e ainda está avaliando um possível afastamento dele do programa”, afirma o diretor artístico e de programação, Hélio Vargas, que ligou pessoalmente para o empresário Marcos Buaiz, marido de Wanessa, para se desculpar.

Segundo a coluna de Mônica Bergamo, publicada na “Folha de S.Paulo” na última quarta (28), o ex-jogador Ronaldo, sócio de Buaiz na agência de marketing esportivo 9ine, teria reclamado à cúpula da Band, pedido providências e rompido com a turma do “CQC” por causa da declaração. Em março, o Fenômeno chegou a participar das brincadeiras do programa, cumprindo uma promessa de subir numa balança para que todos pudessem conferir seu peso.

+ Marco Luque repudia piada de Rafinha Bastos

Procurado por VEJA SÃO PAULO, Rafinha não quis comentar a repercussão do caso e limitou-se a dizer: “Sou comediante, faço piada. Acho a discussão válida, mas outras pessoas podem comentar melhor sobre o assunto”. Mas não há muito que discutir. E seus próprios colegas de bancada no “CQC” acham isso. “Não gostei, isso não é piada, não se encaixa na categoria humor. É uma deselegância, uma agressão gratuita. Ele foi infeliz”, diz o comandante da atração, Marcelo Tas. “Acho que o 'CQC' precisa superar a adolescência, passar dessa fase de rebeldia sem causa”, completa.

Não foi a primeira derrapada feia do humorista. Em maio, outra declaração sua provocou um tremendo mal-estar: “Toda mulher que eu vejo na rua reclamando que foi estuprada é feia pra c... Tá reclamando do quê? Deveria dar graças a Deus”. Nesse caso, a reprimenda foi mais grave, e o Conselho Estadual da Condição Feminina de São Paulo entrou com uma representação no Ministério Público Estadual.

“Uma pessoa que diz algo tão desprezível não deve ter noção de quanto sofre uma mulher que passa por um tipo de violência como essa”, afirma a presidente da entidade e chefe da Delegacia de Defesa da Mulher, Rosmary Côrrea. Em julho, o próprio MP, por meio do Núcleo de Combate à Violência Doméstica e Familiar da Capital, requisitou ao Departamento de Polícia Judiciária da Capital a abertura de um inquérito policial para apurar uma suposta prática de incitação e de apologia do crime. “O estupro é um crime e o estuprador deve ser punido, e não publicamente incentivado”, declarou, à época, a promotora Valéria Diez Scarance Fernandes. Continue lendo...

Um comentário:

Armando disse...

A liberdade de expressão é para ambos: autor e destinatário. O que estão fazendo com Rafinha é mais uma vez a tentativa de mostrar o poder da mídia, mostrando o marketing: "Independente da posição do produto, podemos lançarmos e, na mesma velocidade, retirarmos quem quisermos". Band, Globo, Record. Essa mídia porca já saturou. Rafinha Bastos é um ícone do humor, como sempre foi, como se lançou. Agora, quando o destino das piadas são o "alto poderio" a coisa fica séria. Imprensa hipócrita.